sábado, 23 de janeiro de 2010

(exposição)

Escrevo-Te porque falar não posso, pois a noite se abateu sobre a Terra e é tempo de descansar. Escrevo-Te porque pernoitar me é ilícito, a dor assola o meu âmago inteiro. Eu vejo-Te, e ouço-Te, e a vergonha se abate sobre mim. Quem és Tu, que de mim Te compadeces, que entendes as minhas fugas e aceitas que para Ti corra por não encontrar fôlego em mais lado algum?

Quem és Tu que não Te insurges com as minhas faltas, com o meu embaraço em declarar-Te, com as lágrimas que correm pelos mesmos constantes motivos? Quem és Tu que tens tanto amor tão impossível, tanto abraço reconfortante, tanta força inesgotável, tanto mistério milagrosamente escondido, tanta verdade e sapiência, tão infinita perfeição? Quem és Tu que me impeles a ser melhor; e que me perdoas por falhar em cumpri-lo, sempre? Quem és Tu, minha necessidade básica, minha razão mais premente, minha fonte de existência?

Sim, a vergonha se abate sobre mim. Quem sou eu para ter a permissão de rastejar, esbaforida, a Teus pés? Pois o imaculado chão que Tu pisas se escurece com as minhas errâncias e soluçantes prantos; pois as repetições dos delitos crassos mancham até a fragrância que Tu exalas. A fuga desmedida nada resolve, esconder-me de Ti é não possível; tentar calar-Te em mim é insânia, as Tuas palavras ecoam fazendo ensurdecer qualquer outro pensamento.

Hosana, Hosana. Hosana nas alturas. Quem és Tu que esqueces todos os meus tropeços e me fazes nova criatura, limpa criatura, alva e pronta para recomeçar? E quem sou eu, que demoro tanto precioso tempo a reconhecer o Teu irrepreensível comando? Quem sou eu que Te não mereço, e quem és Tu que me anelas sempre mais? Que foste capaz de Te dar por mim? Que tipo de matéria sou eu, que me entorpeço, e que tipo de criador és Tu, que me aprimoras? As palavras, parcas, jamais traduzirão o rio de emoções que transborda o caudal de mim. As palavras serão sempre parcas, as respostas sempre ilógicas. Pois Tu és Aquele que conheces em secreto, entras, fazes-Te entender, tomas conta e transformas.

Hosana, Hosana. Hosana nas alturas.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Época de Avaliação

História da Psicologia é uma cadeira bonita, superou as minhas expectativas. Eu esperava uma enumeração de factos, cronologias e nomes em todo o seu esplendor. Ao invés disso, encontrei relações inteligentes entre o outrora e o agora, desde a Antiguidade Grega até ao melhor dos dias de hoje, explicando a origem de pensares que se partilham por homens tremendamente afastados no tempo, e fazendo menção às respostas brilhantes encontradas pelos mais afamados nomes.

A coisa mais bonita, porém, de todas as que aprendi, foi esta:

ARISTÓTELES

Potência e acto

Para Aristóteles, todas as coisas do universo tem simultaneamente potencialidade e actualização, com duas excepções – a matéria e Deus. Quanto mais próxima estiver de ter actualizado as suas potencialidades, mais qualquer coisa estará próxima de Deus. Assim, é possível pensar o mundo como uma hierarquia, tendo nos degraus superiores os seres que mais potencialidades actualizaram e nos inferiores a matéria neutra apenas em potência (esta ideia resulta na idade média na Grande Cadeia do Ser). Estas ideias procuram responder ao problema da mudança/permanência. Mudamos, permanecendo o que sempre fomos, pois a mudança é tão-somente uma actualização das potencialidades pré-existentes.

(fonte: Sebenta da cadeira, 2003)


Espero (mesmo) que o trabalho da frequência de hoje dê frutos; sumarentos.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Maturescente

Conversávamos acerca do perdão, do exemplo do perdão perfeito que tínhamos, da centralidade deste, da sua incompatibilidade com as normas vigentes nos dias que passam, andando ou correndo. Durante a conversa pensava apenas na D., e como lhe tenho interdito o meu genuíno perdão, sem contestar a incoerência em que incorria; sem considerar o desapontamento do Exemplo.

É quando me apercebo das dores que a D. carrega, das aprendizagens que a vida lhe traz, que compreendo o óbvio, deliberadamente ocultado. Obedecer e ser amor, como me foi ensinado tantas e tão diferentes vezes.

Depois de tanto, é mesmo isto que faz sentido.

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Apontamento (3)

Não é birra, não é filme, nem sequer síndrome.
Não é pancada, na verdade não é nada.
Não é de ontem nem de agora, é desde o início de sempre.
Não é passível de ser explicado satisfatoriamente.
É tido como desvario; realmente, nem se entende.
Não é argumento, nem máscara, nem lágrima.
Nem apenas uma chamada de atenção.

(é que…
Se tal desse, escolheria não agigantar-me.
Escolheria a candura, a dependência ininterrupta.)


É, sim, facto.
É ânsia, descontentamento teimosamente eterno.
É âmago.

Não quero crescer.

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Ora viva.

Não sabendo como inaugurar o ano dois mil e dez neste tímido recanto, fui procurar escritos passados que servissem para o fazer. Encontrei apenas um rabisco inadequado, escrito há dois anos, no dia doze do presente mês.

Redigi isto:
Está frio e não procuro agasalhar-me mais. Recordo-te como por vezes me acontece. Deve ser o efeito da guitarra dedilhada que toca suavemente e tu não tocas guitarra decentemente. Um acontecimento muito específico invade o meu pensamento, é tão típico dos meus pensamentos, sempre tão específicos, nunca vagos.

Assim me estreio no ano que já é novo há sete dias: com nada de novo para expressar, com falta de palavras para as descrições das vivências belas que me têm pertencido, e também com ausência de sentido.

Bem hajam (: