quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Não se dão beijinhos aos anjos

Ele chegou de cara fechada, feições geométricas e pouco abertas ao riso fácil. Ele falou com a autoridade de quem conhece bem as realidades espirituais, e orou de uma forma, para mim, nova; com tal profundidade e força que quase se sentiram estremecimentos nos limites físicos daquela sala. As palavras que ele deixou trouxeram descanso à minha alma, uma paz sobrenatural, literalmente. É que, nos dias anteriores àqueles, tinha experimentado o medo, verdadeiramente, pela primeira vez. A insegurança palpável, a respiração dificultada por batimentos cardíacos descompassados, aflitos (!). Uma tremenda sensação de impotência e vulnerabilidade, a compreensão clara da possibilidade real de tudo correr mal, ser mau, produzir sequelas gravíssimas.

Tudo isto aconteceu na segurança do meu quarto, de Bíblia no colo. A minha inabalável confiança foi usurpada por um relato horripilante, tão comum neste tempo em que nos encontramos. E os dias e as noites passaram a ser assim, povoados por uma aflição dolorosa, por uma inquietação constante, fruto de uma consciência nova: não é, de todo, impossível que a vida me reserve surpresas nefastas. A tormenta vivida dentro do peito fez-me buscar mais, pedir mais, depender mais. E o culminar desta aprendizagem foi a visita desse anjo (que de angelical nada tem), um mensageiro com palavras de força, de acção, de fé, de capacitação. A sua visita resultou numa compreensão mais clara da base da minha segurança e confiança: deixei de estar firme numa vida vivida num balão cor-de-rosa, e a certeza da protecção passou a ancorar-se na consciência de estar num mundo tenebroso e negro e nunca (NUNCA!) me ter sucedido nada de mal. 

- Pastor W., muito obrigada por ter vindo!
disse, efusiva nos meus agradecimentos. Mas eu não sabia que os anjos não são dados a beijinhos, e recebi de volta um grunhido e uma tentativa de sorriso, dirigindo-se, posteriormente, à saída, numa passada larga e de um modo muito pouco celeste. Chegou, confortou, capacitou, orou, foi usado para transformar e saiu abruptamente, sem sequer saber o impacto que tinha deixado em mim, para sempre.

Deve ter voado para servir noutro lado...

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