sexta-feira, 1 de agosto de 2008

Mês sétimo, trigésimo primeiro dia


Ela esperava. O toque-toque das unhas no corrimão da escada, o passo impaciente naquele metro quadrado, o coração incomodamente palpitante, incessante. Esperava por essa promessa que havia de cumprir-se, a sua chegada, e tremia ao barulho da aproximação de mais um comboio… quem sabe se ele não estaria ali…

Ela esperava. Decidiu largar aquele metro quadrado e avançar por mais uns quantos. Afinal de contas, a praça era bem larga e não estava apinhada de transeuntes como é habitual. Avançou e recuou. Sempre demarcando bem o espaço, alargando a área percorrida, apesar de continuar a delimitá-la com os seus passos. Enquanto esperava apercebeu-se de que fazia parte da visão de um outro homem, talvez também esperando por alguma coisa, que lhe sorria como que dizendo-lhe “podemos enfrentar essa espera juntos”… ela continuava à esperar, junto ao corrimão da escada, sem auxílios humanos exteriores. Esperando, apenas.

Ela esperava, sabendo exactamente, dos doze lances de escada existentes, quais seriam aqueles que ele ia descer. Não sabia como mas sabia-o irrevogavelmente. Esperava continuamente, mais um comboio, mais uma ausência. Durante aquela espera, e quando era possível serenar o peito, ela lembrava todas as situações, palavras, angústias, partilhas, gargalhadas que haviam vivido a dois. E não era capaz de conter o receio grande de que tudo não passasse de uma história virtual, impossível de se materializar. Receava-o, mas esperava. No momento em que ele chegasse ou se dissipavam os medos ou os mesmos se instalavam de malas e bagagens. Só podia esperar, então continuava a fazê-lo.

Ela esperava por esse sonoro ruído que é a fricção entre as rodas do dito comboio, onde ele chegaria, e os carris, e esperava com impaciência. O seu rosto, porém, era calmaria e riso. E todo aquele tempo, símbolo de uma espera tão maior que aqueles minutos, símbolo de uma espera forçosamente paciente, uma espera certa, resoluta, que se eliminaria com a chegada do outro ser. Ela esperava por isso mesmo, por saber que assim era certo e por saber que a seu tempo ele chegaria e ficaria.

Esse sonoro ruído que é a fricção entre as rodas do dito comboio, onde ele chegaria, e os carris fez-se ouvir, finalmente. Pelos doze lances de escadaria distintos desceram inúmeras pessoas. Ele, porém, desceu pelo lance previsto e foi ao encontro dela. E naquele espaço que não é abraço nem é distância, os seus olhos disseram tudo, tão carregados da ânsia que tinham em viver aquele momento. Nesse espaço em que tudo se concretiza os lábios nada disseram nem nada fizeram. Apenas gritaram os olhos brilhantes todas as coisas que já se sabiam. Dissiparam-se, instantaneamente, os receios, e houve toque, houve fôlego, houve um beijo colocado na testa, com os olhos gritantes fechados.

Ela tinha deixado de esperar. Era tempo, era o momento. Esperar vale sempre a pena.



P.S. Um destes dias de Verão, depois da praia matinal, a prima Cristiana adormeceu à janela. Tive mesmo de fotografar.

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