quarta-feira, 16 de junho de 2010

Cinco vezes seis igual a trinta

Lembro-me de ser pequenina e chorar baba e ranho quando o meu pai me dizia: “nestes teus dias livres, escolhes uma hora para trabalhares nas tuas tabuadas”. Estas palavras eram, para mim, como chicotadas. Uma pessoa com sete anos de idade, com nenucos, primos, irmão, avós e tantas coisas para brincar (essas delícias que o Verão traz às crianças felizes), tinha de seleccionar uma hora do seu dia para se sentar e concentrar-se em dois vezes três e sete vezes cinco e nove vezes nove (essa era fácil, oitenta e um).

Eu não percebia nada do propósito daquilo! (sim, hoje já sei que o papá me estava a capacitar, a não deixar desvanecer o ritmo de trabalho ganho durante o ano escolar, a poupar-me tempo nos anos vindouros, quando a tabuada tão bem sabida me permitiria fazer qualquer cálculo super-depressa). Não percebia, e quando me entristecia profundamente, era no segredo dos meus cadernos. Eram aqueles quadradinhos azuis e brancos que me viam as lágrimas, o rosto desfigurado, o “pranto e o ranger de dentes”. Tinha o meu momento de revolta, seguido da fase de mentalização, que por sua vez precedia a embirração; só depois de tudo isto é que me decidia a fazer as ditas tabuadas.

O trabalho em si tomava uns vinte minutos do meu dia. O processo todo a que eu me sujeitava demorava (num dia bom) três horas. Foi o meu querido avô F., numas férias passadas em nossa casa, quem mo explicou pela primeira vez; foi o primeiro, para além dos cadernos aos quadradinhos, a conhecer-me a fúria contra “a hora das tabuadas”, e a revelar-me essa verdade universal: “quanto mais depressa cumprires as tuas tarefas, mais depressa vais brincar”. Mentiria se dissesse que, desde então, foi remédio santo. Mas até hoje, depois de muitas tabuadas e outras matérias que tais, durante a época de exames e na labuta para alcançar as metas a que me proponho, é este o pensamento que me empurra quando nada mais o faz.

“Quanto mais depressa cumprires as tuas tarefas mais depressa vais brincar.”

(“vais brincar”, “vais dormir”, “vais de férias”: são tudo sinónimos.)

2 comentários:

..carlix.. disse...

Bons tempos esses... em só as tabuadas e as contas de dividir nos tiravam o sossego! LOL

Anónimo disse...

Que óptimo, Andreia... eu nunca consegui ultrapassar o "mas é que não me apetece MESMO nada fazer isto."