segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Dia 1 - Gormley

Nasci na cidade do Porto, passei os primeiros anos da minha vida no Funchal e cresci no famigerado Miratejo. Apesar de boa parte da minha existência ser citadina, sempre sonhei com uma vida no campo: uma casa grande (ao invés de um apartamento), com verde a perder de vista e muitos pássaros. Apesar desses sonhos, confesso que não pensei que Deus fosse atender tão especificamente aos desejos do meu coração.



A rua de Gormley é partida ao meio pela linha do comboio, está mesmo encostadinha a Stouffville e tem pouco mais que uma dúzia de casas - lindas e antigas casas de campo. É uma rua histórica e simples, onde habitam humanos, esquilos de toda a espécie, guaxinins, muitos insectos e pássaros (já recebemos visitas de coiotes em raras ocasiões). É também em Gormley que existe uma igreja mais antiga que a própria cidade de Richmond Hill, pois foi construída pelos habitantes que se estabeleceram desta área, dos quais muitos eram agricultores.

Foi aqui que fui recebida de braços e corações abertos, pela minha família emprestada e pela querida igreja que Deus tem sustentado ao longo de 142 anos. Em Gormley descobri porque é que o meu pai gosta tanto de correr, vi o sol nascer muitas vezes e dormi grandes sestas na relva (com os bicharocos que ali habitam). Em Gormley deleitei-me com as árvores de Mapple, pinheiros e outra vegetação, os piscos-de-peito-ruivo, cardinalis, corvos, águias, o vasto milheiral, e toda a natureza que "me fala do meu Deus". Em Gormley conheci o amor de Cristo através de uma igreja que, não sabendo nada de mim, me acolheu e cuidou do meu coração de forma prática e profunda (e fá-lo até hoje). Em Gormley vivi num quarto mimoso preparado só para mim, onde Deus se revelou de forma profunda e extraordinária por entre alguns dos momentos mais dolorosos da minha existência. É em Gormley que está a minha casa canadiana, onde o meu coração descansa só de observar o que está ao meu redor, onde aprendi na prática o que significa pagar o preço do amor, praticar a hospitalidade, e desenvolver um estilo de vida missionário em família.


Não sei o que Deus tem guardado para o meu futuro, mas a beleza rural e plácida da pequenina Gormley enche o meu coração como poucas terras o fizeram. No fundo, Gormley é a experiência mais próxima que tenho do que seria viver no Alentejo, só que deste lado do oceano. Este foi o canto onde me foi permitido morar aquando da minha vinda para o Canadá; é, sem dúvida, o lugar mais bonito onde já vivi.


1 comentário:

Maria João Martins Barreiro disse...

Sempre o comboio... texto muito lindo
com amor mamã